8 de February de 2024
Por Carlos Pimenta
Duas notícias do final de janeiro trazem uma nova oportunidade de reflexão sobre o incessante conflito de classes que permeia as relações sociais no sistema capitalista. Sim, lá vamos nós de novo!
De um lado, a formatura em medicina de Deyvisson Luís Maia, jovem negro que escolheu a música Negro Drama, dos Racionais MC’s, para ser a trilha sonora do momento em que recebe o diploma das mãos da avó, do pai e da mãe. Do outro, o governador mineiro, Romeu Zema, ao afirmar que “a coisa mais comum que acontece é rotular: se alguém é homem, branco, heterossexual e bem-sucedido, pronto: rotulado de carrasco”, no lançamento de um programa para o apoio de mulheres vítimas de violência durante o carnaval de 2024.
Em um país que de acordo com Relatório de Desenvolvimento Humano 2021/2022, publicado pelo Pnud, divide com o Congo a 14ª posição no ranking de países mais desiguais do mundo e, onde até instituições reforçam a existência de pele alva e pele alvo, o teor dos dois eventos é repleto de simbolismos.
O “carrasco” Zema nunca escondeu sua simpatia pelas pautas da extrema direita, o fio condutor de sua vida pública foi e continua sendo a busca pela atenção de Jair Bolsonaro. E, assim como seu ídolo, coleciona gafes e polêmicas, intencionalmente utilizadas para o seu projeto político de postulante a herdeiro do bolsonarismo nas eleições de 2026.
A fala de Zema é mentirosa e contraditória em sua essência, mas serve muito bem ao seu propósito eleitoral de captar votos da extrema direita. Toda a estrutura do sistema capitalista é moldada para privilegiar e prestigiar os homens brancos, heterossexuais e, supostamente, bem-sucedidos. Os dados reforçam esse quadro: 72% dos deputados federais são brancos e, de acordo com um levantamento realizado em 2022 com 48 grandes empresas brasileiras, somente 5,8% de seus quadros executivos são ocupados por pessoas negras.
Por isso uma notícia como a do formando gera tanta repercussão, ainda mais quando apenas 48,3% das vagas no ensino superior são ocupadas por negros e pardos e, 3% dos médicos negros registrados no Conselho Federal de Medicina, vez que o “esperado” é como denúncia os Racionais “me ver pobre, preso ou morto já é cultural”.
Embora o racismo seja evidente, concreto e deva ser combatido, o debate extrapola a pauta antirracista, tanto a fala de Zema quanto os versos de “Negro Drama” demonstram que o eixo principal em disputa é boa e velha luta de classes. As pautas identitárias são importantes, mas não podem distanciar-se ou se sobrepor ao que realmente está em jogo, os ataques perpetrados sistematicamente por bolsonaristas utilizam a velha tática do dividir para conquistar, bem conveniente para o discurso liberal. A crítica deve ser realizada, mas com atenção para justamente não desvincular o oprimido e a classe trabalhadora. As pautas identitárias só serão revolucionárias quando atacarem a raiz das desigualdades e das injustiças históricas.