12 de September de 2023
Pagando em crianças
Por Normando Rodrigues
No século XIX os irmãos Grimm registraram histórias do folclore alemão inseridas no contexto do nacionalismo romântico, um movimento de resistência à racionalização da Contemporaneidade e ao que Weber chamou de “desencantamento” do mundo.
Um dos mitos coletados pelos Grimm se passa na pequena cidade de Hamelin, na Baixa Saxônia, que infestada por ratos contrata um flautista para dar um fim à praga, ao preço de um táler (o “pai” do dólar) por cabeça de bicho morto.
Como ao fim os roedores se afogam no rio Weser, não há cabeças por contar e os bons cidadãos de Hamelin se valem disso para dar calote no místico músico, o qual em represália atrai todas as crianças do burgo para uma caverna e a sela com um desmoronamento, para que morram de fome.
O Brasil sempre pagou seu capitalismo em crianças mortas de fome. O título mundial de concentração de renda no 1% mais rico da população foi alcançado e é mantido graças a milhões de restos esqueléticos de menores inocentes.
Trata-se de escolha. No quesito mortalidade infantil, escolhemos o caminho dos EUA. Vejamos um outro conto.
Era uma vez um brilhante astrofísico e insuperável divulgador científico chamado Carl Sagan. Entrevistado por jornalista tão ilustrado quanto aqueles da Globonews que chamaram de contradição o comunismo cristão de Flávio Dino, Sagan respondeu quanto a ser “socialista”:
“Acredito que o governo tem a responsabilidade de cuidar do povo… somos o 19° país em mortalidade infantil. 18 outros países salvam as vidas de seus bebês melhor do que nós.”
O ano era 1989. Hoje, após mais de 3 décadas de neoliberalismo, os Estados Unidos continuam a ser a maior economia do globo, enquanto em mortalidade infantil caíram para a 50ª posição, segundo dados da Unicef relativos a 2022.
Mas como essa escolha é muito pouco para quem vive de morte, em 2018 mais de 38% da população brasileira escolheram um outro flautista, merdorrágico fascista obcecado pela reação ao conhecimento, pela remistificação do mundo e pela mamadeira de piroca. Porém com resultados muito mais dantescos do que em Hamelin.
No mito do flautista enganado, cerca de 130 crianças morreram de fome. Já graças ao mito fascista, mais de 1,3 mil brasileirinhos viraram cadáveres apenas nos 2 primeiros anos da pandemia. Em junho de 2022, duas criancinhas morriam por dia de Covid-19 no Brasil.
Esse massacre de anjinhos foi um plus. Antes, durante e após existe a notável contribuição da polícia fascista, aqui incluídas das PMs à PRF e todas as outras. Na região metropolitana do Rio, 2 crianças são baleadas a cada semana. E uma delas morre.
Sob os efusivos aplausos daqueles super ricos que se dizem “também humanos”.